domingo, 15 de junho de 2008

Xadrez Exponencial

Segundo uma lenda muitas vezes contada, o jogo de xadrez foi inventado para entreter o rei da Pérsia. O inventor era um homem com apitdão matemática e com imaginação, duas coisas que habitualmente andam de mão dadas. Quando o rei o quis recompensar por ter inventado um jogo tão maravilhoso, limitou-se a pedir grãos de trigo. Pediu que lhe pusessem um grão na primeira casa do tabuleiro, dois grãos na segunda, quatro na terceira e assim por diante, de forma que se duplicasse sempre o número de grãos ao passar de uma casa para a seguinte, até chegar ao fim, à sexagésima quarta casa.
Ao que se conta, o rei ficou surpreendido pela modéstia do pedido, mas ordenou a um ministro do seu governo que satisfizesse o pedido do homem. Estando em causa encomendas de trigo, contando grão a grão, seria engraçado que o ministro fosse o grão-vizir.

O certo é que o vizir, com grão ou sem grão no título, se preocupou com os grãos. Fez algumas contas e percebeu não haver em toda a Pérsia, nem mesmo no mundo inteiro, trigo suficiente para satisfazer o pedido.

Se o leitor leitor está surpreendido, ainda mais terá ficado o rei. Como era possível pedirem-lhe algo que não podia satisfazer?

A sucessão de números de grãos nas casas do tabuleiro - 1, 2, 4, 8, 16, ... - é tão importante que tem um nome. É a chamada "sucessão binária" e tem algumas propriedades que a tornam útil em varios problemas, por exemplo no desenho dos circuitos de computador. A soma dos seus primeiros 64 termos, que corresponde ao número de grãos pedidos pelo inventor do xadrez, é qualquer coisa como 18 milhões de milhões de milhões de grãos.
O rei não imaginava que a sucessão crecesse tão rapidamente. Um crecimento exponencial, dir-se-ia.
E dir-se-ia bem, apesar da função exponencial ser usada para um cracimento contínuo e termos aqui um cresciemnto passo a passo - discreto, como se diz.
Mas a propriedade em causa, que é o crescimento com taxa relativa constante, é comum às progressões geométricas, como a dos grãos de trigo no tabuleiro de xadrez, e à celebre funcão exponencial.
O termo é tão maltratado na linguagem comum que já se afastou do seu significado matemático. fala-se de crescimento exponencial para designar um crescimento rápido. Mas a intuição pode ser enganadora.
Olhe para a sucessão 100, 200, 300, ..., em que as reticências significam que os termos seguintes se costroem segunda a mesma regra, ou seja, que se adiciona sempre 100 a um termo para obter o seguinte. Compare-a com esta: 100, 110, 121, ..., em que cada termo é obtido multiplicando o anterior por 1,1.
Qual delas se dirá que cresce exponencialmente?
Naturalmente a primeira, dirá muita gente de observação imediata. Não é verdade. É a segunda. A primeira é um progressão aritmética, que aumenta a mesma quantidade (100) de termo a termo. A segunda é uma progressão geométrica, que tem uma taxa de crescimento constante de 10%. A primeira parece aumentar mais rapidamente, mas a segunda ultrapassa-a no quadragésimo termo e, apartir daí, deixa-a a perder de vista. Ao chegar a ordem 50 já é o dobro da primeira. Na ordem 55 é trés vezes maior. Na 59, quatro vezes.
As progressões geométricas podem aparentar um crescimento - ou decrescimento - modesto, e depois tornar-se descomunalmente grandes - ou incrivelmente pequenas.
Para dar um exemplo de decrescimento, considere-se um segmento de recta de 10 centímetros e comece-se por dividi-lo ao meio. Divida-se depois ao meio uma metade e prossiga-se até se chegar ao comprimento equivalente ao diâmetro de átomo mais pequeno, o de hidrogénio.
Quantas vezes pensa que será necessário dividir ao meio o segmento de recta? Aceitam-se apostas.
Nuno Crato
professor do ISEG
in passeio aleatório

Sem comentários: