"O senhor Trapattoni dizia-me muitas vezes: 'Álvaro, temos aqui a estrelinha'. O Mantorras ia aquecer e galvanizava logo o estádio e os colegas", lembra Álvaro Magalhães sobre o papel do avançado angolano no título do Benfica na época passada. Agora, esquecido por Ronald Koeman durante grande parte do ano, apontado até recentemente como dispensável pelo holandês, e com a presença no próximo Mundial em risco, por divergências com o seleccionador quanto ao tempo de utilização na última Taça das Nações Africanas (CAN), Mantorras recuperou em Vila do Conde a estrelinha que seduziu Trapattoni - entrou a sete minutos do fim e deu a vitória ao Benfica contra o Rio Ave, já nos descontos.
"Trapattoni tinha previsto um papel mais importante para o Mantorras nesta época. Estava seguro que ele ia estar ainda melhor", garante o ex-adjunto do treinador que devolveu o Benfica aos títulos de campeão. Mas Trapattoni rumou a Estugarda e o estilo de Mantorras não cativou Ronald Koeman. Na primeira volta, dez jogos incompletos, num total de 217 minutos. O panorama piorou com os reforços de inverno: Mantorras teve em Vila do Conde os primeiros sete minutos da segunda volta e correspondeu com o segundo golo da época (contra o Marítimo, em Dezembro, também deu vitória).
O golo permite-lhe dar a volta por cima numa fase crítica. "Andava triste. Ele refugia-se muito nestas alturas, mas avisou que ainda iam ouvir falar do Mantorras", conta um amigo próximo. "É um campeão, já o demonstrou na recuperação da lesão", diz Álvaro Magalhães. Também Oliveira Gonçalves, o seleccionador angolano, elogia-lhe a "força mental nas fases difíceis". Uma aura de sobrevivente que o acompanha desde as ruas do Sambizanga, em Angola - órfão de pai aos três meses e de mãe aos 16 anos, deve a alcunha a um acidente doméstico (Mantorras, homem queimado).
Mesmo se a total reabilitação física do avançado após as várias intervenções ao joelho direito continua a suscitar reservas - "quem viu o Mantorras do Alverca vê que este é completamente diferente", compara Oliveira Gonçalves -, a continuidade de Mantorras no Benfica, com o qual tem um contrato superior a 500 mil euros anuais até 2010, merece a defesa religiosa de (quase) todos. E motivou até emenda pública de Luís Filipe Vieira a Koeman - o presidente é uma espécie de padrinho do angolano em Portugal: recebeu-o no Alverca, vivem lado a lado na Costa da Caparica, Mantorras pôs o nome do dirigente ao filho...
"A dispensa do Mantorras não é uma decisão fácil de tomar no Benfica", garante Álvaro Magalhães. E após Vila do Conde, muito menos.
in Diário de Notícias